Daqui
a três anos serei uma Balzac. O que isso quer dizer? Pode usar esse termo no
feminino? O Word está me dizendo que não. Uma amiga me contou que significa fazer
30 anos e eu acreditei nela. Acreditei em várias coisas que me disse. Nem por
isso todas se concretizaram. Mas ela gostava de se denominar como a Dona da
Verdade. Quem sou eu pra retrucar? Ou duvidar? Ninguém. E quanto mais o tempo
passa, mais perco aquele egocentrismo que muitas vezes era a única coisa em mim
que chamava a atenção das pessoas. O que vai substituí-lo? Não sei. Só sei que
nada sei e na verdade nem me lembro quem disse isso. E isso, para ser muito
sincera, não me interessa.
Não
tenho medo de fazer 30 anos. Sei que muitas mulheres se descabelam, mas pra
mim, acho que vai ser natural. Como algo que se faz naturalmente: andar, comer,
falar, trepar. É, eu tinha que falar trepar. Desbocada é outro adjetivo que
tenho na boca de muitos. E quem sou eu para dizer que eles estão errados?
Ninguém. Só sei que nada sei. Só sei que, se virou senso comum, deve fazer
sentido. Não dizem que a voz do povo é a voz de Deus? Quem disse isso? Não
preciso repetir que não sei, nem que só sei que nada sei, ou preciso? Faz tanto
sentido quanto a rosa falsificada que perde as pétalas. Que largam o centro,
amarelo sol de verão, a pino, no centro, no meio do mundo, no teto.
Incrivelmente
hoje me senti inspirada. Por quê? Não sei. Sei que nada sei e quando se trata
de mim, sei menos ainda. E é estranho porque aprendi a meditar, fiz seminário
hare krishna, decorei mantras, me formei na faculdade, estou na crise dos sete
anos de um namoro, assumi o espiritismo, descobri o poder da sombra, quero
incontrolavelmente casar e sou quase uma Balzac que ficou pra titia. E quanto
mais o tempo passa e tudo passa por mim, menos sei de mim.
Sei
que quero ser melhor hoje do que fui ontem e isso eu sei. Mas o resto, fico
parada, pensando, tentando saber, mas foge da minha linha de raciocínio, como
foge qualquer coisa atrelada a matemática ou a química ou a física ou a
biologia. Só gosto mesmo de português. E nem gosto tanto assim a ponto de
estudar. Acho que nunca gostei de estudar.
É,
se tem uma coisa que o tempo vem me dando de presente é o poder de soltar as
amarras a ponto de assumir que nunca gostei de estudar. Mas que amarras são
essas? De onde vem? Para quem eu tinha mesmo que provar? Algumas pessoas
acreditam até hoje que eu gosto ou que eu me esforço para ser inteligente. Ou
será que sou eu que acredito que elas acreditam? Será que já fui descoberta e
estou só sendo passada para trás? Será que me achar inteligente ainda é
resquício do egocentrismo que penso não ter mais? Não sei. Não importa.
O
que é importa é que se alguém ainda acredita, é uma pena. Sei que isso não mais
me envaidece. Na verdade me envergonha. Máscaras não fazem mais meu tipo. Não
combinam com meu projeto 30 anos. Porque 30 anos é uma idade que merece um
projeto, mudanças, que algo extraordinário aconteça, afinal, são 30 anos. É
sonoro, bonito, melancólico, quase triste, ou quase alegre. Mas no fundo eu sei
que não vai mudar nada. Ou vai? Talvez mude.
Acho
que encher a boca pra falar que se tem 30 anos faz com que as pessoas te
respeitem mais. Por algum motivo elas ainda misturam idade com maturidade. Será
que a etimologia das palavras contribui para isso? Ou seria o sufixo? Não sei. E
nesse caso não sei mesmo. Nunca gostei de gramática. Mas repito, gosto de
português. Aquele sem regras, que se aprende lendo livros, com um prazer livre,
sem censura, ou conjugação verbal. Odeio pretéritos, perfeitos ou imperfeitos.
Só
sei que dentro da gente alguma coisa se altera ao chegar perto dos 30. Eu
sinto, às vezes. Contraditório? Pode ser. Hoje mesmo assumi que sou uma
contradição. E quem não é? Eu prefiro ser, parafraseando Raul, essa contradição
ambulante. É menos chato do que a monotonia do ser sempre igual. Embora eu ame
uma rotina. Porque também não tenho mais aquela necessidade adolescente de
fazer tudo ou qualquer coisa para chamar a atenção. Atenção de quem? Para que?
Por quê?
Sou
mais eu mesma, quanto mais perto dos 30 chego. E talvez com 40 seja mais eu
ainda. Com 50 esteja dentro de mim. Com 60 já seja tão eu que nem me aguente
mais, como não me aguentava com 15, 20 anos. Mas se tem uma coisa que também
não faço mais é plano. Porque planos frustram a gente e pra que sentir
frustração? Tentar controlar o mundo? Não, não tento mais, até porque ando
muito cansada para isso. É, chegar perto dos 30 cansa. Mas é só cansaço físico
e esse, com algumas boas horas de um bom sono a gente recupera facilmente.
Complicado é o cansaço da alma. Aquele de quando os hormônios estão borbulhando
e a vontade que se tem é de explodir o mundo ou se explodir. Nem que seja de
tesão.
Mas
convenhamos, tesão perto dos 30 é bem mais gostoso do que com 15, 20 anos. A
gente até pode não ter mais tanta disposição, até porque as novidades diminuem
numa escala considerável, mas algumas lapidações só acontecem com a idade. O
peito cai, a gente engorda, cria estrias e celulites que não tinha antes, cabelos
brancos e rugas aparecem, mas alguma coisa, talvez sem nome ainda, te dá uma
certeza de ser gostosa, de trepar bem, fazer gozar e gozar gostoso.
E
tudo isso que mencionei antes se torna um detalhe, quase mero, quase irrelevante.
Quase porque obviamente a gente tem grilos. Grilo é o bicho que a mulher sabe
criar com maestria. Se grilo desse dinheiro, as mulheres seriam os seres mais
ricos do mundo. Elas sabem o que grilo come e às vezes fazem questão de
alimentá-los bem. E por serem tão sensíveis, nunca deixam os grilos morrerem,
por mais que incomodem. Criam melhor os grilos do que os próprios filhos.
E
com esse papo de grilo confesso que fiquei um pouco inquieta. As pernas já se
mexem sem controle. Os dedos já estão parados por segundos intermináveis a espera
de um comando cerebral que os faça escrever algo fantástico. Portanto, para não
desgastar esse eu artístico que voltou tão latente, hei de parar por hoje.
Talvez amanhã continue, talvez não. Porque se tem uma coisa que venho
aprendendo, quanto mais perto dos 30 eu chego, é que só o que é divertido vale
a pena fazer.
Não
que a gente não tenha que fazer nunca algo sem graça. Tem, principalmente por
dinheiro, por mais que não se goste dele. Mas o que eu não vou mesmo é fazer
algo sem me divertir, sem ganhar dinheiro. E como escrever não me dá um tostão
furado, ainda, não vale à pena perder o meu tempo e o seu com baboseira. Nem
para realizar um sonho de quando se tinha 15, 20 anos.
OBSERVAÇÃO
NADA IMPORTANTE: Primeiro texto escrito em 3 páginas, sobre os 30 anos que eu farei
daqui a quase 3 anos, com 1.253 palavras. O que isso quer dizer? Não sei. Lembra?
Só sei que nada sei.